Nos últimos anos, as mudanças climáticas têm intensificado os efeitos do B-R-O Bró. As temperaturas, que antes caíam com a chegada da estação chuvosa, permanecem elevadas por mais tempo, o que, aliado ao fato de o Piauí ser uma região naturalmente quente (devido à proximidade com a linha do Equador), dá a impressão de que o período extremo se prolonga. Além disso, as ilhas de calor urbanas, fenômeno em que o centro da cidade registra temperaturas até 1°C mais altas que as áreas rurais, acentuam o desconforto térmico.
O que antigamente era visto apenas como um “calor característico da região” vem se tornando um desafio maior a cada ano que passa. Pessoas que passam pelo período em Teresina há mais tempo relatam que, décadas atrás, o calor era intenso, mas suportável. Atualmente, a sensação é de que o sol castiga mais cedo e de forma mais prolongada.
O tecnólogo em gestão ambiental Dionisio Carvalho afirma que Teresina vive atualmente um momento de colapso, causado pelas temperaturas extremas. “Ano após ano, as temperaturas estão sendo consideradas mais altas. Nos últimos 10 anos, essa temperatura tem aumentado todos os anos. Vamos chegar no colapso, com certeza. Temos que ter consciência de que os problemas relacionados ao calor de Teresina vão interferir na vida de toda a população e das gerações futuras”, alerta.
Os prejuízos da urbanização
De acordo com o tecnólogo, a intensificação do calor está diretamente ligada ao desmatamento urbano e à perda de áreas verdes. Ele faz um alerta para os malefícios da retirada de árvores dentro da cidade, que tem transformado Teresina em um ambiente cada vez mais ambientalmente hostil. “Uma árvore funciona como vários ar-condicionados naturais. Ela contém a poluição, evita que o sol atinja o solo, ajuda a reter a água da chuva e melhora a circulação do vento. Sem árvores, a sensação térmica pode aumentar de 10 a 15 graus”, destaca.
Dionísio afirma que o problema não está apenas na diminuição do cinturão verde da cidade, mas também na remoção de árvores em bairros e avenidas, sem a devida reposição ou cuidado com o replantio. “Plantam mudas, mas não cuidam. Sem manejo adequado, poucas chegam à fase adulta. Teresina está jogando dinheiro fora com plantio de árvores pequenas que não são cuidadas”, reforça.
Além do desconforto, os impactos atingem a saúde e a economia da população. Hospitais registram aumento de casos de problemas respiratórios e desidratação, enquanto famílias veem crescer o consumo de água e energia para amenizar o calor. “As implicações econômicas, ambientais e prejuízos em geral são enormes e só tendem a aumentar”, diz o especialista.
Quem sente o calor na pele
As mudanças vistas ao longo dos últimos anos mostram a percepção comum entre os teresinenses de que a mudança do microclima, associada ao desmatamento, ao aquecimento global, à expansão da cidade e às mudanças climáticas globais, devem dificultar cada vez mais a vivência no estado.
As mudanças climáticas têm intensificado o calor no período do B-R-O Bró.
As altas temperaturas do B-R-O Bró também atingem em cheio quem trabalha em áreas abertas e no comércio popular. No Mercado da Piçarra, zona Sul da capital, o permissionário Alexandre Lira conta que os produtos sofrem diretamente com as altas temperaturas. “O ovo, por exemplo, não resiste muito tempo no calor, ele começa a estragar rápido. A gente tem que repor mercadoria com mais frequência e isso pesa no bolso da gente e do consumidor”, diz o comerciante.
Neste período, é comum que frutas amadureçam mais rapidamente e as hortaliças murchem quase que de imediato. Além disso, consumidores tendem a procurar mais por alimentos ricos em água, como melancia e laranja, mas a oferta sofre com a dificuldade de conservação e transporte. “O calor não perdoa. A gente perde produto e perde dinheiro”, lamenta Alexandre.
O que pode ser feito?
Para enfrentar os efeitos do B-R-O Bró, especialista defendem um conjunto de medidas imediatas e estruturais. A curto prazo, a climatologista Sara Cardoso sugere ações simples, como a redução da emissão de poluentes e o incentivo ao transporte coletivo de qualidade, já que a menor quantidade de carros circulando diminui o calor retido próximo ao solo. Ela também destaca a importância de plantar árvores nativas, capazes de criar microclimas mais frescos e confortáveis.
Já Dionisio Carvalho defende uma política ambiental mais firma, com fiscalização contra o corte irregular de árvores e um programa contínuo de arborização urbana com manutenção adequada. “Já vivemos esse colapso de forma silenciosa, e cada ano será pior se não agirmos agora”, alerta.
As mudanças climáticas têm intensificado o calor no período do B-R-O Bró.
Se por um lado o B-R-O Bró faz parte do calendário cultural do Piauí, com festas e colheitas típicas do período, por outro lado o fenômeno evidencia os efeitos da urbanização desordenada e das mudanças climáticas. O calor extremo deixou de ser apenas uma característica regional e passou a ser um problema social, ambiental e econômico de grandes proporções.
Enquanto isso, a população se adapta da forma como consegue, com hidratação redobrada e uso frequente de ventiladores e ar-condicionados em máxima intensidade. Mas especialista alertam: enfrentar o B-R-O Bró exige mais do que resistência. É preciso planejamento urbano, consciência ambiental e políticas públicas eficazes.
Rebeca Negreiros, especial para o Portal O Dia, com edição de Isabela Lopes.